A crise da habitação na Europa vai ser debatida, durante boa parte de sexta-feira, no Goethe-Institut.
Por Renata Lima Lobo Publicado quarta-feira 13 novembro 2019
O debate sobre o tema do acesso à habitação tem andado aceso e esta semana pode juntar-se à conversa. “Habitação para todos na Europa – Que problemas? Quais soluções?” é o nome da conferência internacional que acontece sexta-feira sob o tecto do Goethe-Institut. Mas não precisa de perceber alemão. As línguas oficiais do evento serão o português e o inglês, com direito a tradução simultânea.
A conferência
Organizada pela Fundação Friedrich Ebert (criada em 1925 e próxima do Partido Social Democrata alemão, de centro-esquerda) e pelo Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, da Universidade Nova (CICS.NOVA), a conferência irá debater o impacto das políticas da União Europeia no acesso à habitação e diferentes formas de contestação e cooperação no contexto europeu. A parte da manhã será dedicada ao diagnóstico de problemas, com oradores do Centro de Estudos Sociais de Coimbra, do Instituto de Ciências Sociais de Lisboa, do Comité Português de Coordenação da Habitação Social, e mesmo de Helena Roseta, cidadã, arquitecta e ex-presidente da Assembleia Municipal de Lisboa. À tarde têm voz alguns dos movimentos portugueses, e não só, que se têm destacado na luta contra as desigualdades no acesso à habitação, compondo os painéis onde se irá falar de soluções europeias para o problema. É o caso da associação Habita!, representada por Rita Silva, e do movimento Morar em Lisboa, pela voz do membro Luís Mendes. A Câmara Municipal de Lisboa também se junta ao debate com Rui Franco, técnico municipal do pelouro da Habitação e representante do município na EU Urban Agenda Housing Partnership, que estuda e propõe medidas para a criação de habitação acessível e de qualidade na União Europeia.
O problema
Falámos com Gonçalo Antunes, co-organizador da conferência e geógrafo no CICS.NOVA, que tem trabalhado o tema da habitação em Lisboa. “Na conferência pretende-se discutir e debater o que se está a fazer para combater um problema que não é só português. Está a afectar todas as grandes cidades”, considera. “Muitas vezes compara-se o que se está a passar em Lisboa com o que se passa desde 1992 em Barcelona. É óbvio que há semelhanças, mas também há diferenças.” E aproveita para lançar um alerta: “As valorizações excessivas do metro quadrado podem ser indicativas de bolhas imobiliárias. É a última coisa de que um país necessita neste momento. Uma subida exagerada relativamente aos custos de vida terá implicações bancárias.” Gonçalo Antunes avança com alguns números reveladores desta “tempestade perfeita” em Portugal, um país que detém apenas 2% de parque público de habitação. “O turismo é apenas uma parte do que tem transformado Lisboa, porque há muitas questões que têm ajudado o mercado imobiliário aquecer de forma muito particular. Para adquirir uma casa em Lisboa, a taxa de esforço no início de 2016 estava em 38%. No final de 2018 subiu para 58%”, diz. “Este processo de gentrificação está a ocorrer porque houve uma alteração ao regime de arrendamento urbano em 2012, houve incentivos fiscais para não-residentes implementados em 2009 e o programa de vistos Gold. E os fundos imobiliários encontraram um grande interesse em Lisboa: reabilitar e colocar no mercado imóveis com valores muito elevados. Ou então compram edifícios e não fazem nada com eles”, lamenta, acrescentando que Lisboa tem hoje 18 mil Alojamentos Locais.
Christine Auer, representante da Fundação Friedrich Ebert em Portugal, considera que este problema tem de ser abordado de um ponto de vista transnacional, de forma a “enfatizar a aprendizagem que pode ser feita com sucessos e fracassos” de outras cidades. E sublinha a importância dos movimentos civis: “Em Berlim o Estado Federal está a tomar medidas, porque houve mobilização de cidadãos que fazem pressão”, avança, destacando que a própria conferência é uma iniciativa de cidadania.
Goethe-Institut. Campo Mártires da Pátria, 37. Inscrição: info@fes-portugal.org. Sex 09.30-18.00. Entrada livre.
Medidas pela Europa fora
Amsterdão
O limite para alugueres de curta duração é de apenas60 dias por ano, um número que pode descer para 30 dias, estando em curso negociação com a plataforma Airbnb. A lotação máxima por aluguer é de quatro pessoas.
Barcelona
Os empreendimentos residenciais com mais de 600metros quadrados terão de destinar 30% da área para habitação social; e o município passa a deter direito de preferência na compra e venda de propriedades para travar operações especulativas.
Berlim
A Gewobag (congénere da Gebalis em Lisboa) comprou670 apartamentos na Avenida Karl Marx para democratizar o acesso à habitação. Em Outubro o município anunciou a compra de mais 6000 e as rendas foram congeladas durante os próximos cinco anos.
Lisboa
Além da criação de zonas de contenção para o Alojamento Local, a Câmara Municipal de Lisboa abre brevemente o Programa Renda Acessível, destinado à classe média, com 7000 habitações (construídas ou reabilitadas) previstas, distribuídas por quase todas as freguesias da cidade. O valor das rendas é fixado entre 10% e 35% do valor do rendimento disponível médio mensal da família.
Palma de Maiorca
É um grande destino de férias e por e simplesmente baniu plataformas como o Airbnb em apartamentos. A excepção são moradias que fiquem em zonas não protegidas, longe do aeroporto ou em edifícios não designados para uso residencial.
Paris
Desde 2018 que os proprietários só podem registar os imóveis no Airbnb com autorização da Câmara Municipal. E foi fixado um limite de noites por ano para pernoitarem hóspedes: 120. Além disso, foi definido um preço médio por metro quadrado em cada bairro e nenhum contrato pode ultrapassar em mais de 10% esse valor.
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