Notícias ao minuto / Lusa
22/09/18
A concentração de hoje, que se realiza também no Porto, quis chamar a atenção para “a crise habitacional” que se vive nas grandes cidades, disse à Lusa Rita Silva, da Associação Habita, um dos 49 grupos que convocaram o protesto.
O aumento dos preços das casas que estão no mercado para comprar e arrendar levam a que haja cada vez “mais pessoas que não conseguem encontrar um sítio para viver”, sublinhou.
Os manifestantes alertaram para os casos “dos jovens que não conseguem sair de casa dos seus pais”, assim como aqueles que não conseguem arranjar um quarto a preços acessíveis para viver na cidade onde estudam, exemplificou Rita Silva, da Associação Habita, um dos 49 grupos que convocaram a manifestação.
Criada em 2012, a Associação Habita tem trabalhado com famílias que estão a ser despejadas das suas casas, mas também com quem não consegue encontrar a sua primeira habitação, disse à Lusa Rita Silva, explicando que este é um problema que se tem agravado nos últimos tempos.
“Registaram-se aumentos de 50, 60, 70% no mercado do arrendamento e de compra”, lamentou.
“A habitação não pode ser um privilégio, a habitação é um direito” e “A casa a quem a habita” foram alguns dos ‘slogans’ que se ouviram e leram nos inúmeros cartazes dos manifestantes que exigem do Governo novas regras que regulem as rendas e que acabem com a especulação imobiliária.
“As políticas anunciadas pelo Governo não respondem aos problemas concretos atuais: não param a especulação, não regulam o mercado, não protegem os direitos das pessoas”, criticou.
Segundo Rita Silva, atualmente o problema da habitação não se limita ao centro da cidade e já chegou à periferia da capital, onde vivem famílias que estão a ser “despejadas de forma cruel e bárbara”.
Por volta das 15:00 havia já centenas de pessoas concentradas no Largo do Intendente, em Lisboa. Alguns chegaram munidos com cartazes ou faixas enquanto outros aproveitaram o chão para desenhar palavras de ordem nos placards em branco.
Entre os manifestantes havia moradores a queixarem-se de serem alvo de processos de expulsão, arrendatários a protestar contra as elevadas rendas e jovens a lamentar não conseguir encontrar uma casa que consigam pagar.
A manifestação partiu cerca das 16:00 do Largo do Intendente em direção à Ribeira das Naus.
Dezenas no Porto
A manifestação realizada no Porto para reivindicar o direito à habitação e contra a especulação imobiliária reuniu algumas dezenas de moradores, mas um número inferior ao que era esperado.
“Temos de estar unidos, eu não estou numa situação de despejo, mas estou aqui em solidariedade com os que estão. Uma manifestação como esta deveria reunir mais pessoas, vejo com tristeza tão pouca gente aqui para um problema tão grande que afeta tanto o Porto”, disse, aos microfones, Jorge Coelho.
Este participante, que já foi autarca na junta de freguesia de São Nicolau, apelou aos participantes para que “não baixem os braços” .
“É com grande tristeza que, depois de 44 anos do 25 Abril, ainda seja preciso estar aqui a reivindicar os nossos direitos fundamentais e que fazem parte da Constituição da República. Eu não sou contra o turismo, mas o turismo está a prejudicar o Porto e os seus moradores. Estão a expulsar as pessoas do centro histórico, a expulsar as pedras vivas que somos nós, que aqui nascemos e aqui fomos criados e não queremos sair daqui”, acrescentou.
À semelhança do que aconteceu em Lisboa, a manifestação do Porto foi organizada por um conjunto alargado e diverso de associações e coletivos que veem “os problemas da habitação e das nossas cidades agravarem-se com o processo de especulação generalizada e com a privatização de espaços públicos e socioculturais”.
Paula Magalhães, da Assembleia de Moradores do Porto, em declarações à Lusa, deixou uma mensagem e um apelo ao presidente da autarquia, Rui Moreira.
“A mensagem que queremos deixar é não abandonar o Porto, não deixar o Porto sem as suas raízes, as suas tradições, sem o povo que faz o Porto”, disse, lembrando que “não são as pessoas que vêm para aqui cinco dias por ano, um mês que seja, que fazem as nossas tradições”.
“Eu estou numa situação de despejo, não quero sair da baixa, é o único sítio onde sei viver e que conheço. Isto já não é o centro histórico, as pessoas já não vem para o centro histórico, vêm para o Porto, a marca que quiseram vender. Isto não é uma marca, é uma cidade com história e com um povo incrível”, acrescentou Paula Magalhães, que disse ter nascido no número 194 da Rua dos Caldeireiros.
Ana Barbeiro, do coletivo O Porto Não se Vende, considerou que é necessário “pensar um bocadinho que cidade é que queremos, se é uma cidade sem os seus habitantes, estamos perto de zonas da cidade que têm mais turistas do que habitantes”.
“Não podemos ter uma cidade onde haja mais lugar para alojar turistas do que a população local”, sustentou, em declarações à Lusa.
Também Marta Dias, da Associação de Moradores do Centro Histórico, pediu “a ajuda do presidente da Câmara”, afirmando que Miragaia, onde o protesto se realizou, “está deserta e, como Miragaia, outras freguesias”.
“Pretendemos que travem esta compra desenfreada dos prédios, que realojem as pessoas no sítio onde nasceram. Aqui em Miragaia há pelo menos sete habitações vazias da câmara”.
Marta Dias contou à Lusa, que depois de terem sido despejados, ela e os seus pais, no dia 06 de junho, foram viver para casa de uma tia.
“Vivemos numa casa pequena, que é partilhada por três famílias”, frisou.
Depois da concentração em Miragaia, os manifestantes desfilaram por várias ruas do Centro Histórico.
A iniciativa realizada em Lisboa e no Porto junta organizações como a SOS Racismo, a Academia Cidadã, a APPA — Associação do Património e População de Alfama, a Assembleia Feminista de Lisboa, a Associação de Moradores e Moradoras do Centro Histórico do Porto e a Associação Terapêutica do Ruído, entre muitas outras.
Setembro é anunciado como mês de ação e luta pela habitação, estando previstas outras iniciativas destinadas a “discutir, denunciar, questionar e desafiar o modelo de desenvolvimento capitalista” que transforma a cidade “num gigantesco negócio”, subordinando-a “às leis de mercado” e excluindo os habitantes, defendem.
“Saímos à rua para lutar pelas nossas vidas, pelos nossos bairros, lugares e comunidades. Lutamos por uma vida digna e reclamamos o direito à construção coletiva dos espaços em que vivemos”, afirmam no manifesto associado à iniciativa.
União de Mulheres Alternativa e Resposta, Casa da Achada, Centro de Cultura Libertária, Coração Alfacinha, Disgraça, Gaia, Habita, Moradores do Bairro 6 de Maio, Morar em Lisboa, Mulheres na Arquitetura, Panteras Rosa e Stop Despejos estão entre os subscritores.
“As políticas atuais não resolvem o problema da habitação. Exigimos habitação digna para toda a gente”, frisam.