Os ideais para discutirmos e criarmos alternativas face a questões como a pobreza urbana; a urgência de planeamentos urbanos mais democráticos e participativos, que respondam de forma mais justa às necessidades dos novos recém-chegados e vítimas de guerra; a construção de espaços públicos mais inclusivos; e os efeitos negativos da gentrificação, foram os temas centrais deste encontro de quatro dias do City Makers Summit, marcado pela companhia de tantos projetos que, dia após dia, fazem a diferença, numa perspetiva local, regional, nacional e internacional.
Os cidadãos-políticos
A ideia de fazer a cidade é sem dúvida um movimento político.
Movimento esse que inclui todas as pessoas com vontade de reclamar uma cidade que promova sobretudo ações com mais poder participativo, e que encorajem mudanças no programa urbano e social. Ao reclamarmos o direito ao espaço público (ou aos espaços heterotópicos que Lefebvre aclamava) como uma “estratégia de sobrevivência”, confrontamo-nos também com todos os movimentos que tornam real a nossa vontade em (re)fazer a cidade.
A ideia de “participação cidadã” é um conceito antigo, mas que nos continua diariamente a estimular. Já em 1969, Sherry Arnstein defendia abertamente no seu livro Uma escada da participação cidadã, que “a participação dos cidadãos é o poder dos cidadãos.”
Não podia ter mais razão!
A cidade circular
Continuamos a viver tempos de grande desigualdade, a nível local e a nível Europeu. Entre outros, a crise do alojamento acessível, a privatização do espaço público ou a pobreza urbana, promovem a exclusão e alienação de muitas comunidades.
Como resposta, New Europe Cities in Transition juntou fazedores da cidade de quase todos os pontos da Europa, para propor soluções e bons exemplos de cidades radicalmente mais resilientes, comunitárias e multiculturais.
Aqui, também a Academia Cidadã, (representada pela Joana Dias e pela Sara Aranha), esteve presente para apontar abertamente muitos dos efeitos causados pelas políticas atuais e sobre uma das maiores tragédias dos dias de hoje: a pobreza urbana. O debate, em formato de mesa redonda, contou com várias participações vindas de países tão diversos como Itália, Eslováquia, República Chega ou Bélgica.
Muitos foram os estímulos e ideias para pensarmos estratégias coletivas que fomentem uma nova democracia nas nossas cidades em transição.
Em conjunto, todos concordamos que as cidades devem ser circulares, e muitos foram os projetos apresentados que têm desenvolvido essa ideia! Iniciativas e organizações como Urban Helsinki, Okus Doma, Ex Rota Print, Urban Gorillas, La Borda ou Locality provam-nos que aquilo que muitos consideram utopia é possível: empreendedorismo comunitário, ação social, economias alternativas, iniciativas grassroots, urbanismo participativo, co-housing ou iniciativas locais geridas pelos moradores.
Assim passamos muito do nosso tempo, entre oficinas, apresentações, diálogos e convívios!
O segundo dia do Summit foi sem dúvida inspirador.
O projeto Caracola foi a prova de que o trabalho em comunidade pode ser sustentável. Assim como em Lisboa, também na cidade Holandesa de Maastricht são muitos os lugares que se encontram inativos, abandonados ou em desuso. O uso (temporário ou não) de espaços para iniciativas culturais, sociais e criativas é uma das estratégias de dinamização e regeneração das cidades Holandesas, que acaba por ser enriquecedora tanto para os proprietários, que evitam a sua degradação ou ocupação ilegal, como para as inciativas, que acabam por ter a possibilidade de poder explorar um espaço para as mais variadas ideias e a preços bem mais acessíveis.
Serão estas iniciativas também uma das estratégias a dinamizar no centro de Lisboa?
Caracola tem desenvolvido aquilo que, a meu ver, se tem tornado numa das ideias mais sustentáveis e criativas dos últimos anos: a regeneração urbana através da cultura e de iniciativas locais.
Centro cultural e social, este projeto é ao mesmo tempo incubadora criativa e espaço coworking, associação educativa e lugar lúdico, onde até se fazem pizzas caseiras!
Melhor ainda, foi desenvolvido em conjunto com a comunidade e com o apoio do Município.
Quando lhes perguntei de que forma é que têm conseguido financiamento, a resposta foi simples: primeiro, os fundadores acordaram uma renda mais barata por um período de dois anos. “E depois?” Depois ou o contrato é renovado ou continuam o projeto noutro sitio próximo. É simples.
Para além disso, têm o contributo das startups que alugam parte do espaço, o apoio do Município e também o apoio da comunidade local, através de contribuições.
Assim como Lisboa, Maastricht é uma cidade em constante transformação, derivado de várias mudanças económicas e demográficas. São iniciativas como Dekor Fabriek – uma antiga fábrica que deu vida a um espaço onde designers e criativos, maioritariamente holandeses, podem mostrar os seus trabalhos; ou Belvedere Maastricht, um projeto de desenvolvimento urbano ainda a decorrer, que tem como objetivo a construção de um novo distrito dinâmico, destinado sobretudo a pequenos empreendedores, criativos, entusiastas pela cultura e artistas – que marcam sem dúvida esta mudança de forma criativa. Ambos os projetos nasceram em reposta à necessidade em haver espaços com rendas acessíveis. As zonas industriais continuam a ser as mais charmosas, e também as mais baratas.
Como boa prática holandesa, saboreamos todos estes projetos de bicicleta, até ao fim da tarde. Neste dia, foi também importante fazer parte de um grupo tão internacional, com quem partilhamos e discutimos as práticas, saberes e estratégias diferentes de cada país.
O Impacto de Amesterdão foi também outra das iniciativas celebradas neste City-Makers Summit, como um começo de uma relação entre países mais forte. Promover a inovação social e o city-making colaborativo foi o início de um conjunto de várias ideias. Entre elas destacou-se a importância para:
- participação cidadã na construção da cidade;
- facilitar o acesso a financiamento, através de práticas comunitárias e economias alternativas;
- permitir uma reinterpretação e redefinir uma melhor regulamentação de forma a protegermos bens comuns, como o princípio da igualdade, da inclusão e da diversidade;
Aqui, também a Academia Cidadã espera contribuir para uma mudança urbana cada vez mais visível e participativa. Porque na cidade, somos nós que criamos as alternativas.
Os fazedores da cidade de alternativas!
Sara Aranha
Fotos:
@Academia Cidadã
@Pakhuis de Zwijger
@Okus Doma